quarta-feira, 14 de novembro de 2007
A polémica em torno da alteração ao Código Deontológico imposta pelo Ministério da Saúde à Ordem dos Médicos, após a emissão de um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR), está acesa.
Cerca de 150 médicos assinaram uma petição de apoio ao bastonário Pedro Nunes contra o que dizem ser uma “deformação” da ética médica imposta a partir de fora.
Segundo Gentil Martins, cirurgião pediatra e um dos primeiros signatários do documento, “os médicos estão a reforçar a posição do bastonário e a demonstrar que tem atrás dele a classe”.
“Estamos dispostos a tudo o que for necessário para evitar este acto ditatorial do senhor ministro da Saúde”, garantiu ao CM.
O parecer do conselho consultivo da PGR – publicado ontem em Diário da República – é claro ao afirmar que as determinações do Código Deontológico em relação ao aborto e à sanção disciplinar de médicos que não sejam objectores de consciência e apliquem a actual legislação devem ser alteradas. Até porque os artigos em questão “contrariam frontalmente as normas do Código Penal”.
Para Gentil Martins, “a posição dos que escolherem ir contra a sua ética está salvaguardada pela lei”, pelo que são apenas “moralmente e não legalmente responsáveis”.
“A lei não pode intrometer-se na ética”, diz.
Sobre o papel da PGR, liderada por Pinto Monteiro, a petição que circula na internet é bastante crítica: “Não admitimos a sujeição deste código a uma ética volúvel, moldada ao sabor dos interesses, conveniências, ideologias ou convicções de quem, em cada momento, detém o poder e a influência.”
Questionado sobre a possível influência do poder político no parecer, Daniel Serrão, membro do Conselho Nacional da Ética para as Ciências da Vida e outro dos signatários da petição, assume que “por definição o PGR é o advogado do Governo e defende os interesses do seu cliente”.
Sublinhando que “nem o ministro nem ninguém tem nada a ver com a forma como os médicos regulam as relações entre si e entre os seus doentes”, Daniel Serrão lembra que o “código funciona como censura ética e não como forma de punição”.
“Faremos tudo o que a lei nos permitir para evitar a alteração”, garante. O Ministério da Saúde “não faz nenhum comentário” à petição.
BASTONÁRIO APRESENTA CARTA
O bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, vai divulgar na próxima quinta-feira – o último dia do prazo concedido pelo Ministério da Saúde para proceder à alteração do Código Deontológico da classe – a resposta à imposição do ministro Correia de Campos. “Nessa data mandaremos uma carta ao ministro com a indicação da nossa posição”, carta essa que será apresentada nessa mesma tarde em conferência de imprensa, explicou Pedro Nunes.
Recorde-se que a posição do Ministério da Saúde surgiu após a emissão de um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR). Entendendo que o Código Deontológico da classe médica vai contra a legislação vigente, Correia de Campos pediu em Maio à PGR um parecer sobre este tema.
Recebida a resposta, que deu razão à posição do Governo, o ministro deu trinta dias à Ordem dos Médicos para informar a tutela das “diligências tomadas para reposição da legalidade”.
Caso a Ordem não aja, o próprio Ministério Público tem meios legais para mudar os artigos polémicos.
MÉDIA MENSAL DE MIL IVG
Nos três primeiros meses de aplicação da nova lei – que permite a realização do aborto, a pedido da mulher, até às dez semanas – foram feitas cerca de três mil interrupções voluntárias da gravidez (IVG), segundo a Direcção-Geral da Saúde.Inicialmente foi enviada uma estimativa aos hospitais que dava como número indicador a realização de cerca de 25 mil abortos por ano nas unidades hospitalares, mas as autoridades de saúde já baixaram essa estimativa.
A Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa, é o local do País onde se tem feito mais abortos.
Também a Clínica dos Arcos – instituição espanhola que recebe mulheres encaminhadas pelos hospitais cujos médicos são maioritariamente objectores de consciência – está no topo da lista.
Recentemente, o Centro de Saúde de Viana do Castelo avançou também para a interrupção medicamentosa da gravidez, o que deverá acontecer noutros centros de saúde.
NOTAS SOLTAS
ANTIABORTO
Vários dos médicos que associam o seu nome à petição estiveram ligados a movimentos antiaborto durante a campanha do referendo.
Gentil Martins participou em vários debates pela vida, a exemplo de Daniel Serrão. Adriano Vaz Serra fez parte do movimento ‘Aborto a Pedido Não’.
CUSTOS DE REFERENDO
A campanha para o referendo ao aborto custou 1,5 milhões de euros. O PS foi o partido mais gastador, com uma despesa da ordem dos 830 mil euros. Os quatro movimentos cívicos que participaram na campanha não apresentaram contas, segundo dados divulgados pela Comissão Nacional de Eleições.
ALARGAMENTO
O Ministério da Saúde está a ponderar alargar a interrupção medicamentosa a outros centros de saúde do País, além de Viana do Castelo. No início de 2008 será feita a avaliação dos locais que poderão pôr em prática esse tipo de aborto. Em duas semanas o Centro de Saúde de Viana fez uma dezena.
Notícia daqui.
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