O aborto medicamentoso pode provocar hemorragias graves e está documentada uma morte na Suécia em 2003 porque a mulher não valorizou os sinais de alarme, alerta hoje Margarida Castel-Branco, da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra
No I Encontro de Estudos Médicos sobre a Vida Humana, a decorrer em Lisboa, a médica vai manifestar a sua preocupação por o folheto informativo sobre o uso da pílula abortiva não indicar os riscos de hemorragias graves ou de morte.
«Está descrito um caso de uma morte, na Suécia em 2003, em que a mulher foi para casa e não soube avaliar bem a gravidade da hemorragia e acabou por morrer por sangrar excessivamente», descreveu à agência Lusa.
A especialista enunciou ainda «cinco casos confirmados e sete muito prováveis» de morte devido a septicemia, ou seja, infecção generalizada resultante da medicação entre 2003 e 2006.
«Quando estas mulheres têm septicemia não têm os sinais típicos da infecção, pode aparecer sem febre ou em poucas horas e as pessoas não se apercebem», explicou.
A especialista também referiu uma situação que poderá ser «mais remota» devido à realização de ecografias: o uso de medicação em gravidez ectópica (fora do útero), que pode levar a uma ruptura, pôr em causa a vida ou a fertilidade futura.
Na literatura científica internacional está descrita uma morte nestas circunstâncias, que incluiu uma ecografia, mas que acabou por ser interpretada como um caso de um embrião muito pequeno e que não podia ser observado.
«A mulher tomou a medicação e acabou por morrer por uma ruptura de gravidez ectópica», referiu. A médica quis desmistificar a «ideia geral» de que usar a pílula abortiva é apenas tomar os comprimidos e abortar na intimidade do lar.
«Há riscos resultantes dos próprios medicamentos que se tomam. O aborto medicamentoso não aparece como a grande salvação em relação ao aborto cirúrgico», referiu.
Este processo é «demorado, dura alguns dias».
Segundo a especialista, a mulher «pode sangrar durante entre nove e 45 dias, em casos mais raros, o que marca desde logo a diferença para o aborto cirúrgico».
A necessidade de informar a mulher de que vai ter dores muito fortes e não meramente dores menstruais e de que em 75 por cento dos casos se recorre a analgésicos narcóticos como a codeína foi também sublinhada por Margarida Castel-Branco.
«O que mais nos preocupa é que neste processo a mulher é deixada muito sozinha. É enviada para casa e é-lhe dito que se tiver dores fortes ou perdas abundantes de sangue se dirija a um estabelecimento de saúde».
«Mas o que são dores, mal-estar acentuado ou perdas abundantes de sangue depende da percepção de cada mulher», salientou à Lusa.
A médica sublinhou também que a indicação de que se tratará apenas de perdas idênticas às menstruais não está completamente correcta porque "saem também coágulos e o embrião (que às nove semanas não tem mais de dois centímetros)".
"A mulher quando está sozinha em casa nesse momento não conta com qualquer apoio físico ou psicológico", recordou.
O aborto medicamentoso consiste em dois momentos, a mulher toma a pílula abortiva RU486 (que actua como antagonista da progesterona) e depois é enviada para casa, numa altura em que ainda não deve expulsar o embrião. Depois de 36 a 48 horas, a mulher terá que voltar ao estabelecimento de saúde para tomar um segundo medicamento com misoprostol, uma prostaglandina sintética que actua por estimulação das contracções uterinas. Neste segundo momento é recomendada a prescrição de um analgésico, porque é a altura em que deverão aparecer as dores mais fortes. A mulher poderá ficar quatro a seis horas no estabelecimento para haver hemorragia e expulsão do embrião, mas também pode ser enviada para casa, dependendo da decisão do estabelecimento ou do perfil da mulher.
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