domingo, 29 de julho de 2007

Droga e Esperança


Um grande amigo meu, ex-toxicodependente, chama-me à atenção para a quantidade de ex-toxicodependentes, entre os 45 e os 50 anos, que estão a passar férias, aqui, na costa alentejana.


Num ápice, contámos mais de dez amigos, todos eles com uma história semelhante.


Em primeiro lugar, foram toxicodependentes em estado avançado, em especial dependentes da heroína. Fizeram as experiências de risco típicas dos drogados, perderam-se e sentiram-se perdidos.


O meu amigo diz-me que o factor mais importante para a sua cura foi nunca terem desistido dele.

Revolta-se com as salas de chuto, por ser um sinal errado, sinal de desistência.


Em segundo lugar, fizeram várias e sucessivas tentativas de recuperação, recaíram mais do que uma vez. A grande maioria libertou-se da droga através de um programa terapêutico específico - modelo de Minnesota.

O meu amigo refere vários outros casos de amigos comuns, que aqui não estão, que tiveram sucesso com esta terapia.


Questiono-me sobre como é gasto o dinheiro dos impostos. Para quê gastar dinheiro em terapias sem sucesso? Não faz muito mais sentido verificar, de modo científico, qual ou quais as terapias de sucesso e investir nessas terapias?


Que interesses se movem na sombra dos milhões de euros do Orçamento do Estado destinados ao flagelo da droga?


Sabem os pais atingidos por este drama qual a terapia mais eficaz?


O Estado sinaliza com clareza quais as terapias de sucesso, distingue-as, encaminha as pessoas para essas terapias?


Há um «benchmarking» credível entre os diversos modelos terapêuticos?


O meu amigo, que conhece este mundo por dentro, desabafa o seu desencanto com as políticas públicas sobre a droga. Toca num ponto que faz pleno sentido: o centro do discurso público sobre a droga deveriam ser os casos de sucesso, aqueles que estiveram ‘agarrados’ e se libertaram.

Mais importante do que como se cai na droga, é como se sai dela.


Mais importante do que a angústia de quem se torna toxicodependente, é finalizar a esperança de recuperação e há muitos casos de sucesso para alimentar a força moral necessária para lidar com a situação.


Em terceiro lugar, a maioria destas pessoas são hoje casos de verdadeira realização profissional ou empresarial.


Reflicto sobre a quantidade de gente de qualidade que se pode deixar envolver pela droga e a responsabilidade social de não se desistir de as recuperar.


Por último, todas estas pessoas são casadas, formaram famílias estáveis, ternas e atraentes. Em vários casos, marido e mulher eram toxicodependentes e saíram da droga juntos. Educaram os filhos no pleno conhecimento da situação que viveram, nalguns casos, mesmo, os filhos já tinham nascido e os pais ainda se drogavam.


São sinais de esperança, amassados em luta e testemunhos de vida.
António Pinto Leite
28 de Julho de 2007 in "Expresso"

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