Não creio que haja grandes motivos de celebração no próximo dia 11 de Fevereiro
Um ano decorreu, e o aborto em Portugal, nas fases mais precoces da gravidez, é já uma realidade. Mas que realidade é esta? Os números, curiosamente, estão aquém do esperado: a estimativa era de 20 mil abortos por ano, mas tudo aponta para que esse número não ultrapasse os 10 mil. Mas ainda é cedo para tirar conclusões. O que é certo é que o aborto, agora legalizado, não é mais uma causa feminista. Mas começa a ser pensado no feminino. Afinal, praticar ou não um aborto terá as mesmas consequências? Num momento complexo de grande tensão, a mulher é, naturalmente, levada a pensar nas implicações de ter um filho (indesejado) para toda a vida. Mas quem é que a alerta de que fazer um aborto também terá consequências... para toda a vida?
Num encontro recente, especialistas norte-americanos e portugueses de diversas áreas científicas (psiquiatria, psicologia, obstetrícia, bioquímica, farmacologia) debateram e ilustraram o impacto do aborto na saúde da mulher, tanto a nível psicológico como físico. Vale a pena determo-nos um pouco nas suas conclusões. Actualmente, a síndrome pós-aborto - considerada como sendo um tipo de desordem de stress pós-traumático - é internacionalmente reconhecida. A associação do aborto induzido com o aparecimento de diversas doenças mentais - entre as quais ansiedade, depressão, irritabilidade, explosões de agressividade, incapacidade de manutenção de relações conjugais, dificuldade de relacionamento com outros filhos que vêm a seguir, comportamentos neuróticos, esquizofrenia, doença bipolar - é uma realidade para a maioria das mulheres que praticam um aborto. É como se o filho, em vez de se desenvolver no útero, passasse a viver, para sempre, no cérebro...
Mas as consequências do aborto também se fazem sentir a nível físico. Hoje sabe-se que o aborto induzido aumenta em 30 por cento o risco de cancro da mama, quando se comparam mulheres que fizeram um aborto com mulheres que nunca o praticaram ou que sofreram um aborto espontâneo. A explicação científica é simples: no desenvolvimento fisiológico da gravidez ocorrem picos hormonais de estrogénios, que, se forem bruscamente interrompidos - como acontece num aborto induzido -, vão desencadear alterações no material genético das células que, facilmente, poderão degenerar em cancro.
O risco de parto prematuro em gravidezes subsequentes também é duas vezes maior, quando se comparam mulheres que fizeram um aborto com mulheres que nunca o praticaram; se, em vez de um, a mulher tiver praticado dois ou três abortos, esse risco aumenta entre 6 a 12 vezes. Actualmente estima-se que 1/3 dos partos prematuros ocorra em mulheres com história prévia de abortamento.
No que respeita ao tipo de aborto praticado, verifica-se uma tendência para que, nas fases mais precoces da gravidez, se recorra preferencialmente ao aborto medicamentoso. Este, concretizado com a toma da pílula abortiva RU486 (mifepristona), no 1º dia, e de uma prostaglandina (misoprostol), 36 a 48 horas depois, aparece como sendo benéfico para a mulher, ao permitir-lhe abortar de forma simples, segura, não traumática e num ambiente de grande privacidade. Além disso, se não tiver complicações, sai mais barato. Mas sabemos que não há medicamentos banais. Assim, após a toma da RU486, podem surgir desconforto e dor abdominais, náuseas, cansaço e dor no peito, enquanto logo após a toma da prostaglandina começam as cólicas uterinas fortes, os espasmos (dolorosos), as náuseas e os vómitos, a diarreia, os tremores e a febre, as tonturas e as crises de hipotensão. Numa segunda fase, os efeitos secundários podem ser levados a tal extremo que se convertem em complicações. (...)
Tudo isto se refere a abortos legais. Assim, não creio que haja grandes motivos de celebração no próximo dia 11 de Fevereiro. Entretanto, há que apostar na educação da afectividade dos nossos jovens. Como diz o povo: "Mais vale prevenir do que remediar!" E é tempo de nos voltarmos para a mulher e lutar verdadeiramente pela sua saúde, aprofundando as consequências do aborto legal e informando-a, com sinceridade, sobre elas.
Margarida Castel-Branco, Docente da Faculdade de Farmácia, Universidade de Coimbra
In Público, 08-02-08
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