quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Emigração e Arte




CCB, em Belém, Lisboa. Museu Colecção Berardo… Confirma-se a impressão negativa. Depois de visitar centenas de museus de arte ao longo da vida, com arte de todas as épocas possíveis, confirma-se a decepção relativa à mostra de pintura moderna e contemporânea ali disponível. Não é, naturalmente, arte antiga, clássica, e não passou a prova do tempo, mas também não é arte fresca, jovem, moderna. Tem 30, 40, 70 anos, não ganhou nada com a passagem dos anos, e também não é verdadeiramente actual, contemporânea. Não é, e talvez nunca tenha sido, bela. Para mim, pelo menos, não é.
Um Silva Porto, um Malhoa, um Tomás da Anunciação, um João Vaz. Ou então, um Monet, um Millet, os impressionistas todos do Musée d’Orsay, são preciosidades. Ou um Edward Hopper, ou a corrente foto-realista do século passado. Ou ainda um quadro a óleo barato “com personalidade” num qualquer mercado de rua, aqui, ou no Brasil. Ou então as telas de Carlos Reis no pequeno museu de Torres Novas. Esses são verdadeiros tesouros, independentemente do “rating” ou da avaliação, pela Christie’s... Agora não me falem nem no “MAM” do Rio de Janeiro, nem no Museu de Arte Moderna de Sintra, esse também com “marca” Berardo, nem, por exemplo, no decepcionante Museu de Arte Moderna do Funchal, na Fortaleza de Santiago.
Vem isto a propósito da forma como são distribuídos os recursos e subsídios do Estado. Vem isto a propósito da forma como são alocados os dinheiros públicos, entre projectos de “gosto duvidoso” e, por exemplo - nunca é de mais lembrar- a falta de apoio à saúde de idosos sem dinheiro para a farmácia ou sem acesso a cirurgias urgentes. E vem isto também a propósito da discriminação entre os próprios agentes artísticos e culturais, entre os que não têm canais de acesso ao poder, e os outros, autores ou agentes culturais, que estão próximos do Poder, dentro do Sistema, bem integrados no "Regime". O dinheiro faz falta, faz muita falta aos portugueses comuns, e faz falta também aos muitos artistas que não têm como chegar ao público, quanto mais ao mercado. Mas para outros (é preciso citar nomes?) há sempre apoios, há sempre um braço amigo do Estado que dá uma ajuda, que desbloqueia uma verba. E será talvez desnecessário indicar aqui o diploma legal que transfere, em cada mês, meio milhão de euros (!!!) para a subsidiação do Museu Colecção Berardo… De resto, enquanto que a generalidade dos museus portugueses se debate com constantes dficuldades de horários por falta de verbas para pessoal, e enquanto os turistas percorrem o país a bater “com o nariz na porta” de inúmeros museus, aqui, no CCB, até parece que estamos no El Corte Inglês, há sempre um funcionário em cada canto.
Pronto.
Acabaram os aspectos negativos. Vamos agora ao lado positivo.
Neste mesmo Centro Cultural de Belém, nestas mesmas salas do Museu Berardo, vale a pena visitar a exposição temporária “Por uma vida melhor” com fotos de Gérald Bloncourt, retratando a imigração portuguesa em França nos anos 60 e 70. A exposição abriu este mês no CCB e prolonga-se até Maio. É fascinante, é interessante e é comovente. Como verdadeira epopeia humana, o drama e a coragem da emigração são aqui magistralmente captados e retratados em simples fotografias e filmes a preto e branco. Também em recortes de jornais e revistas da época. Não perca. Nós não temos, em Lisboa, um Museu da Emigração e da Imigração, como tem Paris ou como tem Nova Iorque (em Ellis Island, na ilha ao lado da Estátua da Liberdade). Mas podíamos ter, e devíamos ter. Enquanto isso não sucede, vale mesmo a pena visitar o CCB, e assim prestar uma justa homenagem aos nossos emigrantes e, de certa forma, a todos os emigrantes.


video de divulgação

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