Embriões no congelador
Por Denise Grady
Desde há cerca de 15 anos Kim e Walt Best têm pagado 200 dólares por ano para conservarem nove embriões num congelador da clínica de fertilidade da Duke University – embriões de que já não precisam, porque já conseguiram ter filhos, mas que Kim Best não admite destruir, doar ou oferecer a qualquer outro casal.
Os embriões foram criados por fertilização «in vitro», da qual nasceu um par de gémeos, agora de 14 anos. Embora o casal, que vive em Brentwood, Tennessee, já não queira mais filhos desde há vários anos, tem sido para ambos um dilema o que fazer com esses embriões restantes. Walt, o marido, não se importava de eliminá-los; ela não suporta a ideia.
«Não há solução fácil», diz Kim Best, enfermeira. «Eu não posso olhar para os meus gémeos sem me perguntar de vez em quando como seriam os outros nove. Por enquanto, vou conservá-los congelados. Consultarei o coração…»
400.000 embriões, pelo menos, mantêm-se congelados em clínicas dos Estados Unidos, mas todos os dias aumenta o seu número, e muitas pessoas, que foram tendo filhos, cada vez acham mais difícil tomar uma decisão quanto ao destino desses embriões. Um recente estudo sobre 1.020 pacientes de fertilidade em nove clínicas revela neles mais do que um simples desagrado pelas opções que geralmente lhes são apresentadas pelas clínicas. O estudo, em que o casal Best participou, foi publicado na quinta-feira passada no jornal «Fertility and Sterility».
Entre os pacientes que não querem mais filhos, 53% não quiseram doar os seus embriões a outros casais, sobretudo porque não querem que outras pessoas eduquem os seus filhos, ou que os seus próprios filhos sofram, pensando na possibilidade de encontrarem um dia um irmão desconhecido.
43% não quiseram que os seus embriões fossem eliminados. Cerca de 66% declararam que talvez os oferecessem para investigação, mas esta opção só seria possível em quatro das nove clínicas. 20% disseram que preferiam conservar os embriões congelados para sempre.
Os embriões podem manter a vitalidade por uma década ou mais, no caso de terem sido congelados apropriadamente, mas, mesmo assim, nem todos sobreviveriam ao ser descongelados.
Alguns pacientes desejam soluções diferentes das que costumam ser-lhes propostas. Entre elas, uma pequena cerimónia durante a eliminação dos embriões, ou a sua colocação no seio de alguma mulher numa altura do seu ciclo em que provavelmente não engravidará, a fim de que morra naturalmente.
A mensagem do estudo é a de que os pacientes necessitam de mais informação antes do processo «in vitro», para saberem que do processo podem sobrar embriões, e que a decisão do que fazer com eles no futuro «pode ser difícil em aspectos que antes não era possível prever», diz Anne Drapkin Lyerly, principal autora do estudo, bioeticista e professora associada de obstetrícia e ginecologia na «Duke University».
Lyerly acrescenta que as conversas (com os pacientes) acerca dos embriões têm de ser «revistas, e não efectuá-las só quando os embriões vão ser congelados, porque os objectivos e até o modo de pensar sobre eles mudam com o tempo ao longo do próprio tratamento de fertilidade».
Bastantes casais andam tão desesperados por ter um filho, que, quando os óvulos são fertilizados na clínica, desejam criar o maior número de embriões possível, para maximizar as suas "chances"», afirma Lyerly. Nessa altura, a ideia de que podem ser embriões a mais nem se põe para muitos deles. (Em Itália, as clínicas de fertilidade não são autorizadas a criar mais embriões do que os que se podem implantar no útero de cada vez, para evitar justamente os problemas éticos originados pelo congelamento de embriões.)
Num estudo prévio de Lyerly, as mulheres assumem pontos de vista muito diversos sobre os embriões: enquanto, para uma, eles «não passam de mais um espécime laboratorial», outra diz que um congelador cheio de embriões é «como um orfanato».
Mark Sauer, director do «Centro para o Tratamento Reprodutivo das Mulheres», no Centro Médico da Universidade de Colúmbia, reconhece: «É uma grande problemática. E marido e mulher podem não estar na mesma página do dossier».
Há quem pague o armazenamento por anos e anos, afirma Sauer. Outros deixam de pagar e desaparecem, confiando à clínica a decisão de mantê-los ou desfazer-se deles. «Preferem que sejas tu a premir o gatilho sobre os embriões», diz o mesmo. «É como se dissessem: "Eu não quero outro bebé, mas não quero arcar com a responsabilidade; sinto culpa demais para te dizer o que deves fazer tu, que é eliminá-los"».
Alguns pacientes pedem que os deixem levar os embriões extra, e Sauer faz-lhes a vontade, confessa, acrescentando: «Não sei se levam para casa e lá os enterram».
Nos E. U. as regulamentações estatais têm dificultado progressivamente a doação a outros casais, requerendo que os doadores voltem à clínica para serem inspeccionadas quanto a possíveis doenças infecciosas, e frequentemente à sua custa, continua Sauer. «Isto reflecte-se em parte na atitude das clínicas», diz ainda, explicando que ele já não sugere sequer que as pessoas ofereçam embriões a outros, enquanto que há dez anos bastantes o faziam.
Kim Best acha que os seus nove embriões «poderiam tornar-se lindas pessoas». Uma das suas jovens filhas é a favor da entrega dos embriões para adopção a outros casais, mas, diz a mãe, ficaria muito preocupada com «o género de pais com quem viveriam, e que espécie de vida teriam».
Sem comentários:
Enviar um comentário