A Emília e a estrela de Natal
Há uns anos atrás, num encontro inopinado num centro comercial, um amigo dos tempos de Universidade apresentou-me a sua mulher, Emília; disse-me que era Conservadora do Registo no Alentejo.
Fiquei logo entusiasmado e pedi-lhe o contacto pois, como advogado, por vezes, surgiam-me questões nessa área e ter uma consultora especialista à mão dar-me-ia muito jeito.
E assim foi, ao longo de alguns anos, volta e meia lá telefonava eu para a Emília, tirando dúvidas sobre registo predial.
Sempre me atendeu de forma muito acolhedora e simpática, mesmo quando, por vezes, estava muito ocupada.
Na realidade, era sempre um prazer falar com a Emília. Sempre foi muito cordial, paciente e generosa para comigo e procurava responder-me com grande profissionalismo e foi graças a si que consegui resolver vários casos bicudos na área do Direito registral.
Volta e meia quando eu ligava, respondia-me a funcionária da Conservatória, a “A sra. Dra. está de baixa por causa da gravidez”. De facto, já lá iam 4 filhos, com gravidezes de risco que a Emília encarava com muita naturalidade, serenidade e confiança.
Um dia encontrámo-nos em Vilamoura quando vieram passar férias aqui ao Algarve. Foi uma hora muito bem passada e deu-me muito gosto estar com eles, todos de cara muito bem lavada. Sentia-se que era gente boa, muito boa e a Emília, a jovem matriarca, na casa dos 30 era a mais bondosa de todos. O seu desvelo por todos os filhos saltava à vista e, ao mesmo tempo, notava-se nela uma enorme disponibilidade para ajudar tudo e todos.
Estava, de novo, em casa com nova gravidez de risco, a quinta; falámos dos miúdos dos meus e dos dela; falámos dos sacrifícios e das renúncias e terminámos a concluir que vale a pena. E lembro-me de a ouvir dizer, duas vezes, “sim, vale a pena, vale muito a pena”.
Disse-me nessa chamada que vinham para o Algarve. Perguntei-lhe se não era perigoso por causa da gravidez ao que me respondeu que não fazia mal porque ficaria em casa a descansar enquanto o pai levaria os miúdos para a praia. Não queria que os filhos ficassem sem férias por sua causa.
Era assim a Emília, esquecida de si e sempre pronta a se dar aos outros e aos filhos em especial.
Despedimo-nos e, mais uma vez, senti-me revigorado com as suas palavras mas também grato e satisfeito por a conhecer .
Hoje, dia 6 de Dezembro, surgiu-me outra dúvida sobre um registo complicado.
Peguei no telefone e liguei para a Conservatória para confirmar se ainda estaria de licença de parto e quando é que voltaria.
Respondeu-me a funcionária “A Sra. Dra. faleceu, faleceu no parto”.
Soube depois que se tinha sentido mal disposta, no Algarve e veio a falecer no hospital em Faro.
O bébé sobreviveu e vive hoje sozinho com o pai e os 4 irmãos.
Ao fim de pouco mais de 3 meses, soube que todos estão a tentar dar a volta por cima, com um grande força, a grande força que só as grandes personagens sabem ter.
Este Natal lá em casa tudo será diferente.
Mas a Emília não os deixou, nem nos deixou.
A sua enorme bondade e a sua enorme generosidade são uma outra estrela que paira no céu neste Natal.
Para mim, e por maioria de razão, para os seus filhos e marido, ela é e será sempre um modelo e o seu exemplo uma estrela que nos ilumina e que certamente os iluminará a todos nesta noite longa, fria e escura.
Beijinhos Emília e até à próxima !
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