quarta-feira, 30 de abril de 2008
“Os profissionais de saúde estão a ser tratados como se não tivessem competências humanas”. A queixa ouviu-se durante um colóquio sobre Objecção de Consciência promovido pelo Centro de Bioética da Escola Superior de Enfermagem São Francisco das Misericórdias (ESESFM). Debaixo de fogo estiveram a lei n.º 16/2007, de 17 de Abril, que despenaliza o aborto, e a portaria n.º 741-A/2007, de 21 de Junho, que regulamenta a interrupção voluntária da gravidez. Este evento realizou-se em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian, a 27 de Fevereiro.
De acordo com a lei n.º 16/2007, os profissionais de saúde têm de assinar um documento onde assumem a objecção de consciência e, a partir daí, ficam excluídos do contacto com as mulheres que procuram os hospitais para fazer uma interrupção voluntária da gravidez. Embora esteja prevista uma consulta prévia, seguida de um período de reflexão, os objectores de consciência, determina a lei, estão excluídos de tomar parte nesse processo. Para o professor da ESESFM e coordenador do Centro de Bioética e Enfermagem, Hermínio Araújo, teoricamente o direito à objecção de consciência está garantido, mas, na prática, receia-se que possa estar também ameaçado. “Não sei até que ponto não vai haver discriminação no momento de contratação ou renovação de contrato de um profissional objector de consciência”, indagou, frisando: “Os profissionais de saúde estão a ser tratados como se não tivessem competências humanas. Há um excesso de juridicismo nesta lei, que não tem respeito pelas convicções das pessoas.”
A mesma opinião tem a especialista em direito privado e professora na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Assunção Cristas, para quem “o profissional de saúde está a ser tratado como um ser autómato”. Em sua opinião, a lei n.º 16/2007 tem uma “inibição desproporcionada”, que “lança um manto de desconfiança sobre os profissionais de saúde”.
Também para a jurista Marília Nogueira, “o objector de consciência é discriminado pelo legislador”, que o considera parcial, impedindo-o de participar na consulta prévia à interrupção voluntária da gravidez.
Outro aspecto criticado é o facto dos profissionais de saúde não poderem ser objectores de consciência em situações específicas. Segundo Assunção Cristas, foram registados casos de mulheres que recorreram à interrupção voluntária da gravidez (IVG) como método contraceptivo ou mesmo com o objectivo de “não perderem férias já marcadas”. Para a professora de Direito da Universidade Nova, em casos deste tipo, os médicos deveriam ter o direito de recusar a realização da IVG, mesmo que já tenham realizado abortos anteriormente.
“Esta lei é uma decepção. Descarta e abandona as mulheres e encaixa-se mais numa óptica de liberalização do que de despenalização”, concluiu a especialista.
O colóquio sobre objecção de consciência reuniu diversos especialistas em direito e saúde que, segundo o director da ESESFM, João Paulo Nunes (ver entrevista), se “preocupam com a objecção de consciência” em todas as suas dimensões de aplicação no terreno.
Notícia daqui.
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