domingo, 9 de agosto de 2009

Para nos fazer pensar

"A relevância que se atribui à educação das crianças e a consciencialização da responsabilidade que, nesta matéria, a sociedade detém, tem vindo a desenvolver-se num crescendo de interesse após a aprovação, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1989, da Convenção sobre os Direitos da Criança. Também em Portugal se tem evidenciado uma clara valorização do estatuto da criança e da importância da sua educação. É de salientar o progresso, na legislação portuguesa, no que diz respeito à salvaguarda da promoção e protecção das crianças. Mas, não obstante este progresso, assinalável, há na sociedade portuguesa fortes desigualdades sociais entre as crianças, uma grande taxa de pobreza infantil (mais de 20%), crianças maltratadas, mal amadas, mal acolhidas pela escola. Estes indícios são reflexos de uma série de factores sociais como o desemprego, os baixos níveis de escolarização dos pais, a maior taxa de mulheres trabalhadoras a tempo inteiro na Europa, factores que, aliados à crescente multiculturalidade, às transmutações da família tradicional com muitas situações de famílias mono-parentais e de crianças sem pais, tornam os contextos educativos muito vulneráveis. Mudanças de comportamentos com tendência para o sedentarismo e a passividade perante a televisão ou o fascínio do entretenimento com jogos informáticos levaram à reorganização dos espaços, dos tempos e das vivências da infância e a um novo relacionamento com o mundo, provocando um modo diferente de apreender e conviver com o real. Vivências em culturas multi-referenciais, disparidade de informações e diversidade de solicitações transformaram a criança num consumidor precoce, alvo de processos de marketing desenfreado."


"O contexto demográfico em que a provisão de educação está a ser assegurada é marcado por uma acentuada redução das taxas de natalidade e de mortalidade, com o consequente envelhecimento da população, só parcialmente compensado com crescentes fluxos imigratórios. "

"Será ainda importante não esquecer a importância de se garantirem estratégias proactivas de incentivo à captação de profissionais de professores e educadores do sexo masculino nas estruturas educativas dos 0 aos 12 anos: a ausência do sexo masculino na educação das primeiras idades é uma privação para as crianças mas, simultaneamente, uma privação para os homens. "
"As crianças portuguesas vivem a instabilidade de uma vida familiar, derivada de uma multiplicidade de factores demográficos, culturais e sociais. Sentem a indisponibilidade dos adultos para estarem -- e brincarem -- com elas, sabendo-se que os pais portugueses são os que, na Europa, menos brincam com os seus filhos, negligenciando assim o valor do brincar como exercitação de competências e integração de saberes evidenciado pelo conhecimento científico ou relegando-o para os contextos de interacção entre a criança e o computador. As nossas crianças são também alvo da necessidade que os pais sentem de as protegerem dos perigos de uma sociedade cada vez mais atentatória da sua fragilidade, levando a exageros que lhes retiram os tempos e os espaços para as "suas" brincadeiras, nomeadamente com os seus pares, crianças da mesma e de outras idades. Desfrutam pouco da riqueza da vida nas comunidades e contactam predominantemente com o elemento feminino vendo-se assim privadas do equilíbrio entre a quietude normalmente transmitida pelo elemento feminino e a ousadia culturalmente referenciada ao elemento masculino."

"As famílias são – e devem continuar a ser – o contexto, primeiro e primordial, responsável pela educação das crianças. Mas as condições de vida das famílias na actualidade requerem apoios, desde a 1ª infância, apoios que têm de ser pensados e aceites numa lógica de complementaridade e não de substituição. "

"No nosso país não existe provisão formalmente reconhecida na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) para a faixa etária dos 0 aos 3 porque se entendeu que é às famílias que compete a socialização primária e a educação das crianças nesta idade (...); no entanto, este entendimento não tem sido acompanhado de políticas familiares e de trabalho consonantes com este ideário. "

In: C.N.E. – CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (2008), Relatório do estudo “A educação das Crianças dos 0 aos 12 anos”. Disponível aqui.
Imagem daqui.

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