Ainda não é conhecida a estratégia argumentativa dos partidos para as eleições, mas uma coisa é certa: não passará pelos verdadeiros problemas nacionais. Apesar disso, talvez valha a pena descrever brevemente essas questões de fundo de que não se falará estes meses.
O nosso principal problema é a decadência populacional. Portugal está em vias de extinção: em 2007 já nasceram menos pessoas do que morreram. A nossa taxa de fertilidade, que desde 1983 é inferior à de reposição das gerações e desde 2002 à média europeia, atingiu agora um dos valores mais baixos do mundo (1,3 filhos por mulher), só comparável ao Japão. Ao contrário do Japão, por cá uma percentagem crescente dos nascimentos vem de famílias imigrantes. As consequências que a degradação da família terá no equilíbrio social, desenvolvimento económico, estabilidade cultural e futuro nacional são incalculáveis. Os outros países europeus, com problemas menores que o nosso, têm há anos políticas consistentes e sustentadas de apoio à família e fertilidade. Por cá, o Governo, não só ignora o assunto, mas subsidia abortos, facilita divórcios, promove homossexualidade.
O segundo problema estrutural português é a adaptação ao aumento da esperança de vida. Vive-se cada vez mais e o número de centenários cresce todos os anos. Isso é excelente, porque a longevidade vem com melhores condições de vida e saúde. Mas a sociedade nada oferece aos idosos, senão uma vida de ociosidade e irrelevância. A atitude face à velhice é a mesma de há 100 anos. Portugal não pode tratar uma percentagem crescente da sua população, a mais experiente e sabedora, como se estivesse "fora de prazo". Além do monstruoso desperdício, surgem enormes efeitos sociais, humanos e pessoais dessa desqualificação. Aqui, embora por razões estritamente financeiras, o Governo deu passos tímidos no bom sentido com a reforma da segurança social.
Estes dois primeiros problemas estão totalmente fora do debate político nacional. Nada podia ser mais estranho aos programas, discursos e tácticas eleitorais. Sobre os dois seguintes há algumas referências nos campos partidários, embora confusas e enviezadas.
O terceiro aspecto estrutural é a atitude face ao progresso. A globalização muda a especialização e distribuição mundial do valor. As novas oportunidades encontram--se reagindo aos sinais dos mercados, não ouvindo a retórica política. Portugal não tem de defender a agricultura, não precisa de garantir o futuro industrial, não ganha nada com a tradição do mar. Não interessa o sector, interessa a atitude. As nossas empresas têm apenas de ser produtivas, rentáveis e dinâmicas, onde quer que seja. Foi assim que nasceram a nossa agricultura, indústria e marinha. Assim prosperarão.
Mas os cidadãos portugueses adoptaram os níveis de consumo e exigência europeus sem aceitarem os níveis de produtividade e as exigências europeias. Todos sabem exigir mas não cumprir o que se lhe exige. Daí o endividamento crescente, desequilíbrio orçamental, desânimo social, decadência política. A Europa deixou de ser um desafio para ser argumento de benesses. Serve como modelo de direitos, nunca de deveres. A consequência é a crise que nos assola há 15 anos, precisamente desde que mudámos a atitude. Se todos pensam que a Europa garante o nível de vida e pedem ao Estado o que só o trabalho, iniciativa e reestruturação das empresas podem dar, não admira a crise.
O último problema de fundo vem directamente da atitude política face aos problemas de fundo. Temos um Estado que ignora a linha estratégica do País e os grandes problemas nacionais. Não sabe o que quer no futuro nem como lá se chega, mas ocupa-se com embalagens de iogurtes, fumo nos edifícios, cadeirinhas nos automóveis e educação sexual. Os governantes tratam do que nos compete, sem fazerem o que lhes compete. Vivemos num equilibrismo mediático e em escaramuças pontuais, esquecendo os desígnios básicos. Assim, o debate eleitoral só pode passar ao lado dos grandes problemas nacionais.
Opinião de João César das Neves, D
aqui (DN).
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