quinta-feira, 23 de agosto de 2007

E a Guerra aqui tão perto...


Há guerras do ópio, guerras do petróleo, guerras de diamantes. Numas a violência é assustadora, noutras é inenarrável, noutras ainda é arrepiante. No caso da Serra Leoa, tratou-se naturalmente de uma guerra de diamantes. Quando foi? Terminou há 5 anos. Onde foi? A uns 5 mil quilómetros da Europa e de Portugal.

Essa guerra distante... foi retratada no filme de 2006, Blood Diamond, de Edward Zwick, com Leonardo DiCaprio, e é agora descrita, de forma clarividente e objectiva por um jovem que há 10 anos atrás, com 13 anos foi arrastado a participar numa verdadeira orgia sanguinária. Chama-se Ismael Beah e o livro foi publicado este ano em Nova Iorque, pela editora Sarah Crichton Books. O relato, feito na primeira pessoa, das “Memórias de um rapaz-soldado” é uma narração nua e crua do percurso de uma criança que perde o paradeiro da família na fuga caótica diante dos ataques do exército rebelde, e que foge, com outras crianças, durante meses, por aldeias, florestas, pântanos, até ser alistado à força pelo exército regular da Serra Leoa para combater. Lateralmente apercebemo-nos de como pôde ocorrer aquilo que de forma muito fugaz vimos algumas vezes nos nossos telejornais de há 5, 6, 7 anos atrás: homens, mulheres e crianças horrivelmente mutilados de dedos, pernas e braços, bandos descontrolados semeando o pânico em veículos carregados de armamento, um país mergulhado no caos, num banho de sangue. O livro descreve a metamorfose de uma criança inocente em criança-soldado, e descreve como os chefes militares se encarregavam de assegurar o inesgotável fornecimento de marijuana e cocaína para os seus jovens exércitos, lançados uns contra os outros carregados de droga, de G3, de AK47, RPG, etc, etc. Mas o livro mostra também que essa guerra distante não era propriamente noutra galáxia nem noutro planeta. Não era num país de aborígenes, nem de pigmeus, muito menos de primatas. Ficamos a saber que o seu autor, e os seus companheiros de – chamemos-lhe – aventuras, já tinham uma boa escolaridade, liam Shakespeare, à noite, para os mais velhos na praça da aldeia, ouviam a música que todos os jovens anglo-saxónicos ouvem, tinham uma vida familiar muito semelhante à nossa, ocidentais...

Vale a pena ler.

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