domingo, 16 de setembro de 2012

Reflexões sobre a dor e o seu significado

Embora a dor seja uma das experiências mais comuns da vida, surpreende sempre e exige-nos continuamente aprender e a adaptar-nos às novas circunstâncias.

Ninguém pode considerar-se “perito” na dor; tem sempre uma dimensão de originalidade: na forma como se manifesta, nas suas causas e nas diversas reações que desencadeia. Muitas vezes encontramo-nos a sofrer profundamente por motivos e razões que nunca esperamos.


A principal peculiaridade da dor humana é que coloca uma questão existencial. «Dentro de cada sofrimento experimentado pelo homem, e também na profundidade do mundo do sofrimento, aparece inevitavelmente a pergunta: porquê? É uma pergunta acerca da causa, da razão; uma pergunta acerca da finalidade (para quê); enfim, acerca do sentido» (2).

Com efeito, quando se empreende a busca do sentido da dor, o ser humano questiona-se sobre o sentido da sua própria existência e procura aclarar o alcance e o significado da sua própria liberdade. «Posso recusar a dor? Posso, porventura, fixar uma distância da dor, eliminá-la? A dor imprime à vida o seu sentido efémero» (3).

Esta experiência humana move-nos a procurar a ajuda de outras pessoas e a oferecer, ao mesmo tempo, a nossa assistência. A experiência da dor ensina-nos a prestar mais atenção às outras pessoas (4). A dor marca a diferença entre uma pessoa madura e equilibrada, que é capaz de enfrentar obstáculos e situações difíceis, e uma pessoa que se deixa levar e absorver pelas suas próprias emoções e sensações.

A interação mútua entre a dor e o amor

A dor é um ponto de encontro entre a alegria da esperança e a necessidade da oração. Os cristãos aceitam a dor com a esperança de um gozo futuro. Estão plenamente conscientes dos seus limites e confiam na ajuda que se implora a Deus na oração.

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Como afirma Viktor Frankl, a capacidade para sofrer faz parte da própria educação; é uma fase importante do crescimento interior e também de auto-organização (15).

Atualmente, a incapacidade para enfrentar a dor e o sofrimento, físico ou espiritual, provém precisamente da falta de “cultura do sofrimento”. Inicialmente, são os pais que temem enfrentar os filhos com o sacrifício. Como consequência, vêem-se tentados a dar-lhes tudo e de forma imediata. Pensam que haverá sempre tempo, mais adiante, para sofrer ou têm a ilusão de que esses momentos nunca chegarão para eles (16).

É difícil entender como uma pessoa pode resistir ao aparecimento imprevisto de uma dor intensa sem a ter experimentado antes. De facto, estas pessoas estão mais propensas a sofrer crises nervosas e depressões.

(...)

Os doentes são um tesouro


Converte-se num tesouro também para outros porque, ao cuidá-lo, praticam a virtude da caridade e enriquecem-se, desde que o cuidado que prestam seja o melhor que podem oferecer.


Profissionais em contacto com a dor

Não é fácil enfrentar a situação de pessoas que sofrem diariamente e, ao mesmo tempo, manter um interesse vivo pelos seus problemas e tristezas. Nestas circunstâncias existe o risco de manusear a dor de maneira anónima, procurando aliviar falsamente a atmosfera em que os profissionais da medicina devem viver diariamente.

Podem encontrar-se enfermeiros muito competentes para quem a dor já não afeta profundamente. Em lugar de ver o doente como um ser humano, com uma visão integral das suas necessidades, centram a sua preocupação no que se requer para responder às necessidades clínicas da pessoa.

Os médicos encontram-se também frequentemente em risco de considerar os doentes de um ponto de vista meramente pragmático, limitando a sua atenção ao diagnóstico e às opções terapêuticas.

Aparte o contacto com o doente durante as etapas de diagnóstico e planeamento de tratamento, os médicos são invisíveis, absorvidos por actividades administrativas, cursos, consultas com colegas e conferências.
(...)
Atualmente, os médicos esquecem com frequência a necessidade fundamental de estabelecer uma relação de verdadeira confiança com os seus doentes. Estes vêem-se estimulados a pôr a sua confiança mais nos medicamentos do que na pessoa que lhos administra.
A burocratização inapropriada na prática médica pode efetivamente destruir a relação médico-doente e reduzi-la a um mero intercâmbio de informação e prescrições, onde as estatísticas tomam o lugar da comunicação interpessoal.


Binetti------------------------


Notas

1. JOÃO PAULO II, Carta Apostólica, Salvifici doloris, 9.


3. C.S. LEWIS, Diario di un dolore, Milano 1990, p. 40.

15. Cfr. V. FRANKL, Homo Patiens, Brezzo di Bodero 1979, p. 98.

16. Cfr. A. MACINTYRE, Tras la virtud, Barcelona 1987, pp. 34-35.

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