segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

U Ime Obitelji


O título não lhe diz nada? É natural. Fora da Croácia, quase ninguém sabe o que se passou no último Domingo, 1 de Dezembro de 2013.

Nesse dia, o movimento «U Ime Obitelji» (que em croata significa «Em nome da família») conseguiu incluir na Constituição a revolucionária definição de que «o casamento é a união de vida entre um homem e uma mulher». O Governo foi incapaz de travar o processo. O Primeiro Ministro considerou a definição aberrante e não queria inclui-la na Constituição. O «U Ime Obitelji» concordava: «de facto, é triste que uma coisa tão óbvia tenha de ser escrita na Constituição»... (Antes, tinha saído uma lei que atribuía às relações homossexuais o estatuto de casamento).

Na Croácia, para convocar um Referendo é preciso recolher, num prazo de 15 dias, as assinaturas de 10% dos eleitores. O «U Ime Obitelji» avisou a população e esta mobilizou-se para uma impressionante «operação-relâmpago», entre 12 e 26 de Maio de 2013.

Na votação para a União Europeia, havia 3,8 milhões de eleitores, pelo que eram necessárias 380 mil assinaturas. No entanto, ainda não tinham passado dois meses, o Governo anunciou que o número de eleitores subira vertiginosamente para 4,6 milhões e portanto o «U Ime Obitelji» precisava de reunir 460 mil assinaturas.

Este anúncio foi muito polémico, porque, segundo as estatísticas oficiais, a Croácia tem apenas 4.480.043 habitantes, incluindo adolescentes, bebés e crianças. Assim, o país ficou com mais 100 mil eleitores do que habitantes, incluindo menores de idade. Grande parte da população achou isto estranho, mas alguns responsáveis da União Europeia aplaudiram, considerando que o Governo Croata estava a ser responsável. Estavam muito preocupados com o resultado do Referendo.

Embora o «U Ime Obitelji» não tenha organização capaz de recolher tantas assinaturas, a mobilização dos cidadãos foi de tal ordem que, em quinze dias, juntaram 710 mil assinaturas válidas. A polícia recebeu milhares de queixas, porque grupos de vândalos atacavam as pessoas que assinavam, mas as autoridades acharam que não era caso para intervir. Paralelamente, o Governo promoveu uma campanha na televisão para demover os eleitores. A maioria dos deputados ainda decidiu que o Referendo não seria vinculativo, mas o Tribunal Constitucional chumbou essa pretensão. A partir daí, as agências noticiosas deixaram de dar informações provenientes da Croácia, talvez para evitar que o mau exemplo contaminasse outros países.

Finalmente, no Domingo passado, a proposta do «U Ime Obitelji» venceu por 66% dos votos.

As agências noticiosas publicaram as palavras consternadas do Primeiro Ministro, que pediu desculpa pela posição assumida pelo seu povo, e ouviram outras personalidades deplorando também aquela vergonha nacional. Quanto aos números, desvalorizaram o resultado, argumentando que a percentagem de abstenção tinha sido maior que nas votações para a União Europeia. Podiam talvez ter acrescentado que o número de votos foi semelhante, o número oficial de eleitores é que cresceu habilidosamente, em poucas semanas.

Agora, para remediar a situação, querem aplicar à Croácia as directrizes de educação sexual que vigoram em Portugal. Não se sabe como é que o povo croata vai reagir.

Quanto a Portugal, ...falemos antes da Croácia.
 
José Maria C. S. André

in «Correio dos Açores», 8 de Dezembro de 2013




 

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